miércoles, octubre 01, 2008

AS DIVINAS TETAS DE CARLOS RUIZ

Por: Carlos Moreira, Paris, maio de 2004.


“Estou bebendo esta noite no Splanger’s
e me lembro das vacas
que pintei certa vez na aula de Arte
e pareciam bem
pareciam estar melhor do que tudo
ali.”
Charles Bukovski

“Uma vaca, no campo, é um ótimo animal.
Mas do jardim nós a pomos pra fora.”
Samuel Johnson

“O mundo viverá enquanto houver homens que protegem a vaca.”
Gandhi

“Quero trezentas tetas estrábicas
nos trilhos da minha boca.”
Nehru Gupta


a iconografia sagrada-profana-metafísica ainda guarda
seus tótens nas cavernas dos nossos crânios e despencam suas pedras sem limo
sobre o tédio da mesmice mimese pleonástica.
o que move ainda a mão do xamã se a chama da tela é pouca
para os bytes os links do seu desespero?
não é mais de pólvora no peito – salve maiakóvski gogh artaud
entre os grandes lábios de camile claudel – não é mais de pólvora no peito
seu salto cabriolesco mas de tiro na corda da forca do dia
agente infiltrado em si mesmo pra descobrir o áspero veludo da cor
o tropeço trágico o patético pileque protomérico que gera a arte
que vale a pena porque se enfia fundo nos olhos do senhor mercado
e gira como canivete sem anestesia vácuo no vácuo do buraco oco
desse mundo morto de merda e porcaria.
sua alucinada essência sem moldura esborra dos poros out-siders
como o sangue novo da virgem entre os dedos truculentos do amante.
a arte persiste obsceno pássaro da noite jaguar embaixo da coberta
de novo aqui com o mesmo vigor e fome engolindo goya e ruminando
finas fatias de frida. carlos ruiz merecia um bom mecenas
só assim teria tempo de desenhar pintar cantar fazer bonecos
comer e dar um pulo na itália ou quem sabe pela grécia.
deveria ser visto enigmático e magro caminhando numa praia andaluza
e ter tempo de escrever cartas a seus pares.
ruiz vive nesse nosso tempo de monturo
e o que vai sobrar disso tudo?
ruiz não terá gertrude pra lhe comprar um quadro ou dois
e lhe oferecer um conhaque com miró ou com picasso.
tempo sem delicadeza e generosidade em que o artista suplica anorexia
todo mérito é “relativo” toda descoberta é “falsa”
o singular diminuído pela superioridade numérica. se em cem anos
ainda houver mundo gostaria de saber o que terá ficado disso tudo.
as tetas monstruosas e generosas de carlos ruiz mereciam ficar esborrando
no futuro o seu aroma mistura de almíscar canela e curare.
conheci as mãos e pés de suas personas o inúmero dos pênis
as cores as dores infinitas das bocas dos canalhas mamando mamando
nas tetas das telas e fora delas miseráveis que somos filhos mumíferos do caos.
vi o modo como via e como pintava com o tubo mesmo de tinta e com o corpo todo
lá dentro do quadro seu pulso manando tempo no ouvido dos olhos
a tinta cegando o olho de palha da grama verde do nosso pasto incendiado.
estamos todos pastando. espelho cínico do faminto banquete a pintura de ruiz
que duvida que algum de nós (000000000,1...) levante a cabeça e veja o sol
entre os colhões do céu. pinta como quem canta grita ou discursa em javanês
no meio da paulista no meio dos escombros das mortas siamesas
surfando uma tora de castanheira rio madeira acima.
não esperem encontrar pintura numa exposição de pintura.
as coisas não são tão simples.
mas é possível que você se encontre na língua na boca na goela
sedenta grudada na teta divina duma tela dele
entre objetos confusos mal-redimidos da última noite de sodoma – e se reconheça.
cretinos divinos cretinos sem destino senão morrer de beleza e indigestão
mamamos condenados a vaca da vida e da morte
besta de duas cabeças e trezentas patas e gargalhamos insanos
entre as cores e as telas do úbere-xamã chamado carlos ruiz.


pontos a (quem quiser (e puder)) considerar:

o magma da imagem em ruiz queima mesmo os que nada entendem de pintura. querer saber por quê.
é preciso perceber o oblíquo de cada imagem: o tema nunca é atacado de frente: o olhar é raptado pelo viés da ironia e do escracho (bom palpite para um cotejo plástico-visual: qual seria a pintura-cantiga-de-escárnio? como será um quadro-de-maldizer?)
o quadro é um composto de imagens que participam por sua vez de um composto de quadros. natureza plena de intertextualidades tranversais transgressões.
todo primitivismo é falso. não há não-intencionalidade em nenhum elemento de nenhuma das obras.
as formas “animais” são rebaixadas às formas “humanas”.antropomorfismo decadente. zoomorfismo invertido.
nem im nem ex: pressionismo puro superfície à tona. as entrelinhas (todo sentido é subliminar) rasgadas para fora como enchimento de bonecas.
cada quadro começa e termina em si mesmo mas é a releitura plena de todos os outros. o uroboro se devora até virar pelo avesso e recomeça o seu trabalho. insaciável.


Por: carlos moreira, paris, maio de 2004.
carlos ruiz, artista plastico, brasil, Cali, colombia,

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